Olá amigos, calculo que tenhais aqui chegado, seguindo o convite e sugestão do meu irmão, o trapalhão do Alcino. Eu chamo-lhe trapalhão, já desde pequeno, que foi quando ele começou a andar com aquele ar aluado e sempre a falar em verso. Os meus pais diziam que ele era uma criança distraída, mas a professora da escola sempre soube que o meu irmão estava destinado a outros voos e até meteu uma cunha para ele ir para a Força Aérea, mas chumbou, por causa dos óculos.


Eu, como vêem, já desde pequeno que me deu mais para a História da Humanidade, a começar pela que vivia lá em casa, nomeadamente. E sempre o fiz na certeza porém. Como Dumas pai e Doutras filho, sempre persegui a verdade e não fui em comboios, nem mesmo depois de já os terem inventado.

E, como entrada, já chega de melão com presunto e vamos ao assunto.

sábado, 19 de outubro de 2013

Nada disso, eu é que sei.
Aquilo na altura ainda nem se chamava cabo de s. Vicente, nem havia corvos, só melros, que é mais pequeno e tem o bico amarelo. Distinguem-se bem, mas, como era de noite quando lá chegaram e os melros também são pretos, pensaram que eram corvos marinhos algarvios, que são mais pequenos, por causa do ar do mar, que mirra.
Mas, nem foram os melros, o que os assustou e fez largar tudo e fugir com o que tinham. Foram os cães sarracenos, que desataram a ladrar e acordaram os aldeões moçárabes que guardavam a sepultura do santo.
Estavam eles portanto de cu para o ar a escavar a sepultura do mártir s. Vicente, para o levar para Lisboa, como mandatário da candidatura de Afonso Henriques a dono da cidade, quando os cães desataram a ladrar. Aí largaram tudo e desataram a correr em direcção à praia e à frágil embarcação que os trouxera até ali. Cada um levava o que tinha podido apanhar. Um, uma tíbia do santo, outro um dedo do pé, um outro, um osso de galinha, por engano...  Para trás deixavam a sepultura aberta e revolvida e restos do esqueleto espalhados pelo chão. 
Foi isso, aliás, o que aquietou os cães e lhes permitiu sair dali em segurança.

Pelo caminho, cansados e emocionados com o susto, adormeceram. Também as garrafas de medronho que, entretanto, roubaram de uma barraca, na praia, ajudou à moleza. 
Enquanto dormiam e atraídos pela santidade que emanava dos ossos que seguiam, ao monte e no meio de uns restos de peixe, no fundo do barco... dois anjos desceram do céu e poisaram, um à popa, outro à proa e puseram-se a balançar a frágil embarcação, com a intenção de fazê-la virar e resgatar a relíquia sagrada e levá-la para o reino da Glória. Como se sabe, no Céu não há brinquedos e os querubins brincam com os ossos dos santos e outras relíquias sagradas. E velas. Fósforos é que não. Só velas.
Mas, voltemos à nossa barca. Com os balanços, os tripulantes acordaram. Acordaram naturalmente mal dispostos. Depois de todos terem vomitado, voltaram-se uns para os outros, espantados. Que diabo, o mar está tão calmo, como é que o barco abana tanto. Foi quando viram, à proa e popa do barco os dois seres alados, que entretanto se tinham transformado em corvos, para não serem identificados, nem mandados borda fora. Que os anjos voam, mas não sabem nadar. Isso é os patos é que fazem. 
E transformaram-se em corvos e não em pombas, por duas razões. Uma é o respeito. Pomba é pássaro que está reservado às altas patentes. E depois, em corvos, sabiam eles que os marinheiros acreditavam. Jogaram pelo seguro. E, para além disso, corvos são pretos. Pombas são brancas. E o branco suja-se mais.
Enfim, quando viram os corvos, olharam todos para o capitão e perguntaram ao mesmo tempo: olha lá, estes não são os corvos do teu pai?
O mestre olhou e disse: são pois.
Eh pá! - todos em coro - isso quer dizer que estamos a chegar a Lisboa!
E estavam.
E assim é que foi.   

1 comentário:

  1. Professor Germano, camano, atão hoje é que é dia de S. Vicente e você, madiê, não faz um post a celebrar a efemérida, mérida!
    'Tá maaaale!
    Um abraço amigo,
    Rui

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